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16 de janeiro de 2011

Revisão do Código Florestal pode legalizar área de risco e ampliar chance de tragédia

Casas na serra entre a cidade de Petrópolis e o distrito de Itaipava 



Texto no Congresso deixa de considerar topo de morro como área de preservação e libera a construção nas encostas. Locais como esses foram os mais afetados pelos deslizamentos que mataram mais de 600 pessoas no Rio 

As mudanças propostas pelo projeto de alteração do Código Florestal -pensadas para o ambiente rural e florestas- ampliam as ocupações de áreas sujeitas a tragédias em zonas urbanas. O texto em tramitação no Congresso deixa de considerar topos de morros como áreas de preservação permanente e libera a construção de habitações em encostas. Locais como esses foram os mais afetados por deslizamentos de terra 
na semana passada na região serrana do Rio, que mataram mais de cinco centenas de pessoas.
O projeto ainda reduz a faixa de preservação ambiental nas margens de rios, o que criaria brecha, por exemplo, para que parte da região do Jardim Pantanal, área alagada no extremo leste de São Paulo, seja legalizada. A legislação atual proíbe a ocupação em áreas de encostas a partir de 45 de inclinação, em topo de morro e 30 metros a partir das margens dos rios -a distância varia de acordo com a largura do rio. A proposta já foi aprovada por uma comissão especial e deve ser votada pelo plenário da Câmara em março. Se aprovada, vai para o Senado.



PARA QUE SERVE

Nos morros, o objetivo da lei atual é preservar a vegetação natural, que aumenta a resistência das encostas e reduz deslizamentos de terra. Nas margens dos cursos d'água -rios, córregos, riachos, ribeirões etc.-, a área reservada visa preservar as várzeas, espaços onde os alagamentos são naturais nas épocas das chuvas fortes.
Boa parte da legislação não é cumprida, principalmente nas cidades. Mas as prefeituras, responsáveis por fiscalizar as regras e impedir a ocupação dessas áreas, têm os dispositivos à disposição.
Mesmo que a ocupação irregular ocorra, os limites atuais facilitam a remoção sem necessidade, por exemplo, de desapropriação de terras, afirma Marcio Ackermann, geógrafo e consultor ambiental, autor do livro "A Cidade e o Código Florestal". Ele diz que as áreas de preservação permanente previstas no Código Florestal coincidem, na maioria, com as áreas de risco de ocupações. Ackermann cita como exemplo os locais onde morreram pessoas na semana passada em Mauá (Grande SP), e Capão Redondo (zona sul de SP). O mesmo ocorre, diz, na maioria dos locais atingidos pelos deslizamentos na região serrana do Rio.



CRÍTICAS

O secretário do Ambiente do Estado do Rio, Carlos Minc, critica as mudanças. "O que ocorreu no Rio -[já] tinha acontecido antes em Santa Catarina e outras áreas- mostra um pouco onde leva essa ocupação desordenada das margens de rios e das encostas. Eu acho que isso mostra a irresponsabilidade dessa proposta", diz.
O relator do projeto de revisão do Código Florestal, deputado federal Aldo Rebelo (PC do B-SP), nega mudança nas regras de ocupação das cidades, embora o texto fale, com todas as letras, sobre regularização fundiária em áreas urbanas consolidadas. Rebelo critica Minc, de quem é desafeto. "Não é por acaso que acontece essa tragédia no Rio, é por causa de secretários incompetentes e omissos como Carlos Minc."



Créditos:  Folha.COM

12 de janeiro de 2011

Comigo ninguém pode



O Brasil tem uma grande variedade de plantas tóxicas, mas as duas espécies deDieffenbachia spp (D. picta Schotte e D. seguine Schott) conhecidas como 'Comigo-ninguém-pode' são as campeãs de acidentes. Especialmente com crianças.
'Comigo-ninguém-pode' é muito enganadora. Bonita por fora mas perigosa por dentro. Seu veneno também é enganador, porque não é exatamente como um veneno. São mais como 'espinhos', muito pequenos, que estão do lado de dentro.
Coloco espinhos entre aspas porque não são exatamente espinhos. A seiva e os tecidos da'Comigo-ninguém-pode' estão impregnados de cristais de Oxalato de Cálcio, que apesar de serem bonitinhos no microscópio eletrônico, quando entram em contato com as células, fazem um estrago enorme, ativando, na opinião dos pesquisadores do departamento de farmacologia da UFRJ, mecanoreceptores (neurônios sensíveis ao contato) e nociceptores (neurônios ligados a dor) diversos, que disparam uma resposta do tipo inflamatória, com a imediata formação de Edema (inchaço), ainda que não tenha a ver diretamente com o sistema imune.
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Os acidentes acontecem principalmente com crianças, mas alguns adultos desavisados também, porque levam a planta a boca e o edema acontece na língua e na glote, impedindo a respiração. E essa é outra razão pela qual essa planta é um problema tão grande. Como o inchaço era semelhante ao de uma forte reação alérgica, como aquela desencadeada por quem não pode comer camarão mas come, os médicos tratavam como alergia. Não adiantava nada. Um dia, em alguma uma emergência, alguém, sem saber mais o que fazer, deve ter resolvido colocar um anestésico apenas para aliviar o sofrimento do pobre coitado com a língua inchada. E qual não foi a surpresa quando o edema... diminuiu!
Eugenol, presente no Cravo-da-Índia, é capazes de reduzir o edema causado pela planta. No estudo em anexo, eles ainda acreditavam que o papel dos critais de oxalato era apenas 'carregar' o veneno, que seria outro. Mas os resultados mais recentes, apresentados na excelente palestra do prof. Paulo Melo (Farmaco/UFRJ) no Instituto de Biofísica, mostram que mesmo após múltiplas e diversas lavagens, capazes de remover qualquer substância aderida, os cristais continuam afetando especificamente os neurônios do local exposto a planta. O que o Eugenol faz, assim como outros analgésicos tópicos, é bloquear os canais de sódio dependentes de voltagem dos neurônios, responsáveis pela produção das correntes elétricas que permitem a comunicação com o Sistema Nervoso Central. E sem comunicação com o cérebro, termina a produção das substâncias que induzem a resposta inflamatória (como o CGRP sigla em inglês para 'peptídeo relacionado ao gene da Calcitonina') . E o edema diminui.
Você consegue imaginar o estrago que faria na sua língua uma lambida em um cactus? É mais ou menos o mesmo estrago que fazem os cristais oxalato de cálcio na superfície das células da língua. Um cactus pelo menos tem os espinhos a mostra, a gente tem como evitar. Mas esses 'espinhos' da 'comigo-ninguém-pode' estão escondidos dentro dela.
Se você encontrar uma "comigo-ninguém-pode" pela frente, faça de tudo para se manter afastado.
Dip EC, Pereira NA, & Fernandes PD (2004). Ability of eugenol to reduce tongue edema induced by Dieffenbachia picta Schott in mice. Toxicon : official journal of the International Society on Toxinology, 43 (6), 729-35 PMID: 15109894


Créditos.: http://scienceblogs.com.br/rainha/